sábado, 16 de fevereiro de 2013

UM ARTIGO PARA NÃO PERDER DE VISTA


Diplomacia sem medo


Guilherme de Aguiar Patriota

A mania de diminuir o Brasil só pode ser medo de um país grande dar certo, o que em muitos aspectos já está acontecendo.

O derrotismo encontrou até acolhida teórica na formulação de que o país “não possui excedente de poder” e, portanto, não pode aspirar a objetivos fora do fácil alcance das mãos.

Essa tese predestina o quinto maior país do mundo – hoje sexta economia – a um desígnio de perpétuo alinhamento aos mais fortes, numa versão diplomática do mal-afamado complexo de vira-lata.

Verificamos ser necessário que uma estrangeira (Julia Sweig, do Conselho de Relações Exteriores dos EUA) nos ajude a interpretar de forma mais sofisticada e, ouso dizer, positiva, o episódio da suspensão do Paraguai do Mercosul e da incorporação da Venezuela ao bloco. Esta última iniciativa vinha se arrastando por vários anos. Os termos da acessão já haviam sido negociados e firmados no mais alto nível pelos chefes de Estado dos quatro membros do Mercosul e do país entrante. A plena incorporação da Venezuela ao Mercosul – não custa lembrar -foi ratificada pelos poderes legislativos dos países que ainda conservam sua plenitude democrática intacta no âmbito do agrupamento subregional.

A angústia antecipatória com o êxito também se voltou contra a Rio+20, declarada um fracasso ab initio por exército de “especialistas”, muitos querendo acoplar à maior conferência da história das Nações Unidas suas respectivas agendas políticas paroquiais.

Pouco importa o fato de a organização do evento ter sido impecável. Foram 17 mil inscritos na Rio-92; 48 mil na Rio+20 – eventos de dimensões incomparáveis.

O resultado espetacular para padrões da ONU não parece encontrar eco entre aqueles que apostavam ideologicamente no fracasso. O país anfitrião convenceu (não pela força ou malícia, mas pelo talento de seus diplomatas) 192 Estados membros a aprovarem por aclamação um documento de 49 páginas, 283 parágrafos, que versa sobre praticamente todos os temas da agenda internacional. Não se produziram tratados. Mas, para quem lida com o multilateralismo, uma visão de futuro consensual vale mais do que compromissos pontuais juridicamente vinculantes.

O Brasil incorporou ao consenso sua visão de como estabelecer um círculo virtuoso entre crescimento econômico, inclusão social, e proteção do meio ambiente. Muitos franziram a testa porque o documento não consagrou o caminho das “soluções de mercado”. Não se criou mais um fundo assistencialista, ou uma nova agência especializada da ONU – como se resolvessem.

Finalmente, temos os órfãos dos acordos de livre comércio assimétricos, utilizados para promover a abertura unilateral de mercados em países em desenvolvimento. A obsessão por tais acordos não está em sintonia com o mundo pós-Lehman Brothers, sujeito a manipulações cambiais, a afrouxamentos quantitativos trilionários e ao protecionismo do mais forte.

Surpreende que ainda existam pessoas que prefiram reduzir tarifas a reduzir pobreza. Na atualidade da crise, os regimes de comércio têm de levar em conta equilíbrios mais amplos de fatores. É necessário pensar em integração de cadeias produtivas, geração de demanda e empregos, segurança alimentar e energética, acesso à tecnologia e ao conhecimento, produtividade e sustentabilidade. É preciso entender que o dinamismo econômico migra dos países ocidentais desenvolvidos para conjunto cada vez mais assertivo de países em desenvolvimento em processo de expansão quantitativa e qualitativa.

De minha parte, capto ao menos um consenso positivo entre os analistas nacionais: o reconhecimento de que o peso e a projeção do Brasil se alçaram a níveis nunca antes vistos na história deste país.

Tenho orgulho do quanto o país avançou nos meus quase 30 anos de carreira. A complexidade dos desafios, a densidade de nosso papel e as responsabilidades que assumimos não têm nível de comparação com o universo mais simples da diplomacia menos arrojada de antanho. Felizmente, a liderança brasileira de hoje não sofre de vertigem.

GUILHERME DE AGUIAR PATRIOTA é embaixador e integrante da Assessoria Especial da Presidência da República.

domingo, 9 de setembro de 2012

Porque voto em Alfredo Costa


domingo, 20 de novembro de 2011

Viagem ao Níger



Estive em Niamey, no Níger, nos dias 24 e 25 de outubro de 2011 para participar da Conferência "Por um Desenvolvimento Durável nas Zonas Áridas da África" (ICID África, 2011). 
A Conferência foi uma promoção do Governo do Níger, em colaboração com o Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE-Brasil), a Agência Pan-africana da Grande Muralha Verde (APGMV-Sahel), e o Instituto de Pesquisa para o Desenvolvimento (IRD-França). 
Apresentei o Acordo para o Desenvolvimento Sustentável (documento que sistematiza a contribuição do CDES à Rio+20, assinado por 72 organizações da sociedade civil brasileira) na Mesa Redonda “Mudança Climática, Políticas Sociais e Segurança Alimentar”. Outros projetos de instituições brasileiras foram apresentados na Conferência, entre eles: o projeto de Segurança Alimentar CGEE-EMBRAPA; e a Politica de Gestão de Recursos Hídricos e de Solos, pela Agência Nacional de Águas (ANA) e pela Fundação Cearense de Meteorologia e Recursos Hídricos (FUNCEME).
O País é uma experiência extraordinária, para compreender o que estou falando basta admirar a arte nigerina, que exemplifico com pequenos mosaicos de uma cultura complexa e rica. Para mim, a viagem foi importante para reafirmar as imensas possibilidades de cooperação entre Brasil e África, pois além do aspecto cultural, estamos unidos por problemas comuns que representam importantes impeditivos aos nossos projetos de desenvolvimento.  

Na abertura do evento, o Presidente da República do Níger, Issoufou MAHAMADOU,  agradeceu o apoio do Governo brasileiro na organização da Conferência e frisou o valor dessa potencial parceria para intercâmbio de idéias e debates, por meio dos quais a África pode se beneficiar das experiências de políticas públicas do Governo brasileiro. Ao citar o desafio de enfrentar os problemas da insegurança alimentar, o Presidente mencionou o trabalho do governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e, como exemplo, o Programa Fome Zero, modelo a ser reproduzido no Níger por meio da Iniciativa 3N (Nigerinos-Nutrem-Nigerinos).
A declaração final da Conferência ressaltou a importância de fortalecer a coalizão política e científica entre África, Brasil e França, para o desenvolvimento sustentável em regiões semiáridas. A população desses biomas, no planeta, mais de 2 bilhões de pessoas, é extremamente vulnerável às mudanças do clima e, nessas regiões, um expressivo contingente dessa população se encontra em condição de extrema pobreza (com base em dados do Banco Mundial, estimas-se que 40% da população da região do Sahel vivem abaixo da linha da pobreza). É grande o interesse do Brasil nessa coalizão, pois este bioma corresponde a 11% do território brasileiro, presente nas regiões Nordeste e Sudeste. Trata-se de uma das regiões semiáridas mais populosas do mundo, com 36 milhões de pessoas. O Plano Brasil Sem Miséria identificou 16,2 milhões de brasileiros e brasileiras em situação de extrema pobreza, dos quais 52,5%, ou 8,5 milhões de pessoas, estão no Nordeste, região que concentra 86,48% do semiárido brasileiro e já enfrenta um grave processo de desertificação que ameaça a segurança alimentar da sua população.
As características físicas e sociais do semiárido brasileiro nos aproximam dos problemas enfrentados por um conjunto de 11 países africanos que fazem parte da região do Sahel e estão reunidos no projeto pan-africano “A Grande Muralha Verde”: Senegal, Mauritânia, Mali, Burkina Faso, Nigéria, Níger, Chad, Sudão, Etiópia, Eritréia e Djibuti. O projeto objetiva a estruturação de um cinturão verde ao longo dos países das região seheliana, por meio do reflorestamento de áreas contínuas com espécies nativas que venham sobretudo impedir o avanço da desertificação e da degradação das terras, e, ao mesmo tempo, possam proteger a floresta tropical africana. Outras ações de desenvolvimento-sustentável são previstas no âmbito deste projeto para que a vulnerabilidade das populações dessas áreas possa ser minimizada.
A Declaração de Niamey, Documento final da Conferência, ressalta a coalizão para o combate à desertificação e à degradação das terras africanas e defende ações de responsabilidade compartilhada, através: da criação de espaços de diálogo que fomentem a interlocução entre o conhecimento científico e a ação dos tomadores de decisões; de políticas públicas que garantam a proteção dos recursos naturais; da democratização do conhecimento científico e da educação às populações; de pactos sociais locais nos processos decisórios das políticas públicas; de políticas nacionais de segurança alimentar e nutricional fundadas nos princípios de segurança e soberania alimentar; de acordos de cooperação Sul-Sul e triparte ; entre outros.
Acompanhei o Comitê Científico em reunião onde foram apresentadas as conclusões finais da Conferência ao Primeiro Ministro do Níger, Chefe de Governo, SEM.Brigi Rafini. Na reunião, o Primeiro Ministro ressaltou o interesse especial do Níger de construir uma parceria estratégica com o Brasil. O Governo do Presidente Issoufou MAHAMADOU deixou claro em todas as manifestações que tem o Brasil como referência para a construção de suas políticas sociais e para o enfrentamento da extrema pobreza que, segundo o Banco Mundial, atinge 8,3 milhões de habitantes, cerca de 60% da população do País.



segunda-feira, 17 de outubro de 2011

Imperdível a análise do Bessa Freire. vamos divulgar!

Ima

TAPAJÓS E CARAJÁS: FURTO, FURTEI, FURTAREI
José Ribamar Bessa Freire
09/10/2011 - Diário do Amazonas
 
Essa foi a vaia mais estrondosa e demorada de toda a história da Amazônia. Começou no dia 4 de abril de 1654, em São Luís do Maranhão, com a conjugação do verbo furtar, e continuou ressoando em Belém, num auditório da Universidade Federal do Pará, na última quinta-feira, 6 de outubro, quando estudantes hostilizaram dois deputados federais que defendiam a criação dos Estados de Tapajós e Carajás.
A vaia, que atravessou os séculos, só será interrompida no dia 11 de dezembro próximo, quando quase 5 milhões de eleitores paraenses irão às urnas para votar, num plebiscito, se querem ou não a criação dos dois Estados desmembrados do Pará, que ficará reduzido a apenas 17% de seu atual território caso a resposta dos eleitores seja afirmativa.
A proposta de divisão territorial não é nova. Embora o fato não seja ensinado nas escolas, o certo é que Portugal manteve dois estados na América: o Estado do Brasil e o Estado do Maranhão e Grão-Pará, cada um com governador próprio, leis próprias e seu corpo de funcionários. Somente um ano depois da Independência do Brasil, em agosto de 1823, é que o Grão-Pará aderiu ao estado independente, com ele se unificando.
Pois bem, no século XVII, a proposta era criar mais estados. Os colonos começaram a pressionar o rei de Portugal, D. João IV, para que as capitanias da região norte fossem transformadas em entidades autônomas. O padre Antônio Vieira, conselheiro do rei de Portugal, D. João IV, convenceu o monarca a fazer exatamente o contrário, criando um governo único do Estado do Maranhão e Grão-Pará sediado inicialmente em São Luís e depois em Belém.
Para isso, o missionário jesuíta usou um argumento singular. Ele alegava que se o rei criasse outros estados na Amazônia, teria que nomear mais governadores, o que dificultaria o controle sobre eles. É mais fácil vigiar um ladrão do que dois, escreveu Vieira em carta ao rei, de 4 de abril de 1654: “Digo, senhor, que menos mal será um ladrão que dois, e que mais dificultoso será de achar dois homens de bem que um só”.
N um sermão que pregou na sexta-feira santa, já em Lisboa, perante um auditório onde estavam membros da corte, juízes, ministros e conselheiros da Coroa, o padre Vieira, recém-chegado do Maranhão, acusou os governadores, nomeados por três anos, de enriquecerem durante o triênio, juntamente com seus amigos e apaniguados, dizendo que eles conjugavam o verbo furtar em todos os tempos, modos e pessoas. Vale a pena transcrever um trecho do seu sermão:
- “Furtam pelo modo infinitivo, porque não tem fim o furtar com o fim do governo, e sempre lá deixam raízes em que se vão continuando os furtos. Esses mesmos modos conjugam por todas as pessoas: porque a primeira pessoa do verbo é a sua, as segundas os seus criados, e as terceiras quantos para isso têm indústria e consciência”.
Segundo Vieira, os governadores ”furtam juntamente por todos os tempos”. Roubam no tempo presente , “que é o seu tempo” durante o triênio em que governam, e roubam ainda ”no pretérito e no futuro”. Roubam no passado perdoando dívidas antigas com o Estado em troca de propinas, “ vendendo perdões” e roubam no futuro quando “empenham as rendas e antecipam os contrato, com que tudo, o caído e não caído, lhe vem a cair nas mãos”.
O missionário jesuíta, conselheiro e confessor do rei, prosseguiu:
“Finalmente, nos mesmos tempos não lhe escapam os imperfeitos, perfeitos, mais-que-perfeitos, e quaisquer outros, porque furtam, furtavam, furtaram, furtariam e haveriam de furtar mais se mais houvesse. Em suma, que o resumo de toda esta rapante conjugação vem a ser o supino do mesmo verbo: a furtar, para furtar. E quando eles têm conjugado assim toda a voz ativa, e as miseráveis províncias suportado toda a passiva, eles como se tiveram feito grandes serviços tornam carregados de despojos e ricos; e elas ficam roubadas e consumidas”.
Numa atitude audaciosa, padre Vieira chama o próprio rei às suas responsabilidades, concluindo:
“Em qualquer parte do mundo se pode verificar o que Isaías diz dos príncipes de Jerusalém: os teus príncipes são companheiros dos ladrões. E por que? São companheiros dos ladrões, porque os dissimulam; são companheiros dos ladrões, porque os consentem; são companheiros dos ladrões, porque lhes dão os postos e os poderes; são companheiros dos ladrões, porque talvez os defendem; e são finalmente, seus companheiros, porque os acompanham e hão de acompanhar ao inferno, onde os mesmos ladrões os levam consigo”.
Os dois novos Estados – Carajás e Tapajós – se criados, significam mais governadores, mais deputados, mais juizes, mais tribunais de contas, mais mordomias, mais assaltos aos cofres públicos. Por isso, o Conselho Indígena dos rios Tapajós e Arapiuns, sediado em Santarém, representando 13 povos de 52 aldeias, se pronunciou criticamente em relação à proposta. Em nota oficial, esclarece:
“Os indígenas, os quilombolas e os trabalhadores da região nunca estiveram na frente do movimento pela criação do Estado do Tapajós, porque essa não era sua reivindicação e também porque não eram convidados. Esse movimento foi iniciado e liderado nos últimos anos por políticos. E nós temos aprendido que o que é bom para essa gente dificilmente é bom para nós”. 

domingo, 9 de outubro de 2011

CÍRIO CABANO
André Costa Nunes
www.terradomeio.com.br


Paraense, ateu. Filosoficamente, materialista. Devoto de Nossa Senhora
de Nazaré. Este último atributo, no mês de outubro, transcende os
demais. É inerente ao ser paraense.

Durante algum tempo, no auge do obscurantismo ideológico da juventude,
ainda tentei renegar, mas romântico inveterado, há muito deixei de
remar contra a maré. Mergulhei de cabeça no paraensismo, o que não
existe sem açaí, tacacá, Ver-o-Peso, marés, rios e ilhas. Canoas e
torço nu. Sem camisa. Sem a devoção à Virgem de Nazaré.

E isso tudo, à imagem do próprio Rio Amazonas, como em um caudal,
deságua em Belém, no segundo domingo de outubro. A colossal procissão
do Círio, com milhares, fala-se até em milhões de romeiros, diz-que,
começa na catedral da Sé e termina cinco ou seis quilômetros depois na
Basílica de Nazaré, mas um olhar atento vai além.

Vê que a romaria começa em cada furo, rio, igarapé, ilha ou beiradão.

Canoas, ubás, caxiris, barcos, a motor, vela ou remo. Começa nas
palafitas e barrancos. Nos quintais das cidades, no porco cevado, no
patarrão, no ralar da mandioca, no tipiti, e no moer da folha de
maniva. Matéria prima para o almoço do Círio. Maniçoba e pato no
tucupi. Farto e generoso. Para a família, para os amigos, e quem mais
chegar.

Começa no vestido de chita com babados, decote comportado e
comprimento a baixo dos joelhos. Calça e camisa de manga comprida,
novas, as únicas mudas de roupa compradas no ano, mas estreadas no Dia
da Festa. Sapatos, sandálias, baixas ou de salto, tênis?
Nenhum. Acompanhar o Círio de Nazaré se vai descalço. Naturalmente.

Começa com banho-de-cheiro. Vinde-cá, priprioca, patichouli, orisa,
pau-cheiroso, chama, pau-rosa, catinga-de-mulata. E se vem de todos os
cantos do Estado Pará que em outubro se transmuda para além das
fronteiras geopolíticas. Invade o Maranhão, o Amazonas, o Amapá. É
como se fosse o Estado de Nossa Senhora de Nazaré. Esse é o núcleo
central tangido pelas águas, senhora de todos os destinos.

Essa é a procissão cabana de antes da estrada, do asfalto, do ônibus,
do avião, do arranha-céu, do apartamento, do estacionamento proibido.

Essa nova tribo do fast food também é bem-vinda. Por adesão, é claro,
afinal, no manto da Virgem e no coração cabano há sempre espaço de
sobra. Apenas há que aderir ao espírito secular do Círio. Ficar
mundiado pelo bom e pelo bem. Sentir-se igual. Caminhar descalço.

É por tudo isso, pelo peso dessa enorme bagagem da cultura paraense,
que, todos os anos, quando passa a berlinda da santa, este velho
comunista se emociona e chora.

domingo, 19 de junho de 2011

Viagem a Portugal e Espanha



Este mês viajei a Portugal e Espanha. Reuni com importantes personalidades desses países e, entre todos, havia um forte consenso: " o nome desta crise é Europa".
Encontrei Portugal ainda sob o impacto das últimas eleiçōes. A população, em geral, não estava satisfeita com o pacote de medidas para enfrentar a crise que foi anunciado pelo Governo de Sócrates (PS). Sabem que a política de ajustes também é apoiada por Passos Coelho (PSD), mas, pelo que percebi, não perdoam Sócrates por ele não ter apresentado alternativas. Para os socialistas porém, o resultado das eleições desafia a lógica, como traduz Martin Schulz: "Durão Barroso forçou Sócrates a cair pelas medidas que Barroso pediu e vai agora implementar". O líder socialista se refere ao programa de austeridade que a Troika, Comissão Européia, BC europeu e FMI, está impondo à Portugal e outros países em crise na Europa.
O que ouvi em Portugal e Espanha indica que a crise é de grandes proporçōes e abrange as dimensōes política, econômica e social. Considero que a situação decorre das escolhas políticas que a Europa fez, principalmente a partir do final da década de 90. Primeiro pela  opção do trabalhismo inglês em constituir-se "terceira via".  O "novo trabalhismo" inglês influenciou os socialistas europeus que abriram mão do confronto aberto com as políticas neoliberais já hegemônicas em toda a Europa, lideradas por Thacher na Inglaterra e Kohl na Alemanha. Por isso, a vitória dos trabalhistas na Inglaterra em 1997 e as sucessivas vitórias socialistas e social-democratas que aconteceram na região, não significaram a retomada do estado de bem estar social e do programa histórico dos partidos socialistas.
A proposta da terceira via marginalizou os sindicatos e as correntes socialistas do partido trabalhista inglês, que passou a defender a economia de mercado, a flexibilozação do trabalho, a desregulamentaçōes e a economia globalizada. Essas diretrizes, sem dúvida, influenciaram a Agenda de Lisboa e o plano de desenvolvimento europeu aprovado pelo Conselho da Comunidade em março de 2000.
A opção por uma suposta "modernidade", focada em competitividade e na cópia do modelo americano foram fontes de inspiração para a Agenda que pretendia, antes de 2010, "transformar a União Européia na economia do conhecimento mais competitiva e dinâmica do mundo, capacitando-a um crescimento econômico duradouro em que haveria uma melhoria quantitativa e qualitativa do emprego e maior coesão social".
Em 2004, foram fixadas as prioirdades para fortalecer a Agenda de Lisboa por José Monoel Duråo Barroso, presidente da Comissão Européia: 1) melhorar o investimento em redes e em conhecimento, 2) reforçar a competitividade da indústria e dos serviços e 3) promover o prolongamento da vida ativa. Confirma-se o foco na "competitividade, inovação e qualificação".
No Brasil, mais ou menos no mesmo período que essas idėias ganhavam força na Europa, o Partido dos Trabalhadores venceu as eleições com o candidato Luiz Inácio Lula da SIlva. O programa vitorioso propunha o social como eixo, a democratização do Estado e das relaçōes sociais como princípio e uma orientação externa que permitisse a presença soberana do país no mundo como condição necessária para o seu desenvolvimento.
O resultado desses dois projetos distintos pode ser conferido em 2010 com o balanço de resultados da agenda européia do crescimento via competitividade e aqueles apresentados pela agenda brasileira do crescimento via inclusão social.